sexta-feira, 7 de março de 2008

A nossa cineCidade

Desde a sua criação que o Viver procurou introduzir no seu âmbito uma reflexão mais alargada sobre a cidade quer na vertente individual da arquitectura quer na óptica mais abrangente do urbanismo.

Por outro lado, e porque a instalação de equipamentos culturais "oficiais" tarda, achámos que um pouco de proactividade nunca fez mal a ninguém, decidindo avançar para a criação de várias iniciativas que possam contribuir para o surgimento de alguns pólos culturais que permitam, de alguma forma, multifacetar a vivência dos cidadãos da zona, a nosso ver demasiado centrada nos ritmos monocórdicos da rotina casa-emprego-televisão.

Nesta perspectiva, estamos a organizar um ciclo de debates denominado CineCidade que pretende, em cada sessão, a propósito de um filme (que pode ser documental ou de ficção), promover uma conversa, em jeito de tertúlia, à volta de alguns temas da arquitectura, do urbanismo ou do paisagismo, com ligação ao Alto do Lumiar.


Porquê fazer mais um ciclo de conferências sobre cinema e arquitectura?

Em Portugal, mais do que se falar (e bem) sobre arquitectura, respira-se mal arquitectura. Crescemos e vivemos rodeados de (se me é permitida a expressão) an-arquitectura. De intervenções casuísticas, mal-pensadas ou pensadas com pouca solidez técnica e menor cultura visual. Tirando os "happy few" que tiveram a possibilidade de visitar outros países e ser confrontados com esse choque do pensado, com essa sobrecarga de informação visual, com essa possibilidade de comparar olhares, de construir uma realidade pensada, somos cidadãos rarefeitos de referências, a quem não é fácil, sem a ajuda de profissionais, ganhar olho crítico, ganhar exigência, exercer cidadania.

Uma vez que não é a maioria do espaço construído que nos cultiva naturalmente o olhar, terão de ser os que deveriam ter sido os fautores únicos desse mesmo espaço a, pelas palavras, nos ajudar a essa construção.

Porquê o cinema? Porque o cinema é, entre muitas coisas, uma construção de uma ficção sobre um espaço reinventado, é um modo de olhar novo sobre aquilo que quotidianamente habitamos.

Porque não juntar alguns documentos sobre essa maneira de reinventar um espaço ou de criar um espaço novo e - numa das infinitas leituras que uma obra pode ter - oferecer aos presentes a leitura de quem tem como profissão - e paixão - a criação e a reinvenção do espaço?

Seria esta, ainda assim, razão suficiente para lançarmos MAIS UM ciclo de conferências?

Acresce o lugar onde vivemos. O Alto do Lumiar/ "Alta de Lisboa" é, no presente, o grande projecto de refundação urbana de uma parte de Lisboa. Os seus habitantes, voluntária ou impositivamente (os realojados PER) habitaram-na baseados no pressuposto de melhoria da qualidade da habitação, apoiados na publicidade institucional ou comercial que definiu o sítio - e os edifícios - com os de melhor qualidade da cidade. Será assim? Terão os moradores bases técnicas e culturais para compreender e concordar com esta imagem? Terão a capacidade para fundar os seus protestos, mais do que em sentimentos ou impressões, em bases tecnicamente válidas?

Foi precisamente para possibilitar um acréscimo de capacidade para melhor entender e sentir este canto da cidade - o seu - que pensámos uma série de eventos sendo este ciclo o que nos pareceu ter maior possibilidade de sucesso, pela relação atractividade/qualidade dos apresentadores.

Em termos genéricos, e no que se refere aos convidados, procurámos conjugar vários factores: autores de projectos para a "Alta" / autores de mérito e intervenção reconhecida ; representação das três áreas da arquitectura presentes no Alto do Lumiar: urbanística, "civil" e paisagística ; autores "consensuais" / autores "polémicos". No que respeita aos filmes escolhidos como ponto de partida, procurámos que as escolhas não fossem demasiado óbvias - pretendendo assim que o conferencista / apresentador pudesse fugir aos lugares-comuns que esse óbvio acarretaria. Na escolha dos filmes pesou ainda a decisão dos organizadores de apresentar alguns documentários que, por si só, pudessem posicionar historicamente a génese da intervenção no bairro.


O local escolhido garante a envolvência: o salão de Inverno do edifício ex-EPUL na Quinta das Conchas, mesmo à beira da Alameda das Linhas de Torres, no limite do Alto do Lumiar. agora sede da Academia Portuguesa da História que nos acolhe e com quem preparámos este ciclo.


As sessões terão início pelas 18:30 de várias sextas-feiras a começar ainda este mês. Nos convidados, nomes grandes, polémicos, gente que entusiasma e polemiza, gente actuante. A prometer um fim de tarde bem passado. Com intervalo para conviver e tudo.

6 comentários:

Anónimo disse...

do Publico
"Em Lisboa, o túnel é comprido, não sei se consigo ver luz"
07.03.2008, Catarina Prelhaz
Sem dinheiro para obras, o presidente António Costa não sabe o que fazer aos prédios degradados. Os seus munícipes e inquilinos têm muitas queixas

"Quando me preparei para esta reunião, fiquei em choque." Fez-se silêncio. "Este é um dos maiores escândalos que existe na cidade de Lisboa." O vereador do Urbanismo, Manuel Salgado, olha para os papéis, agora para os 300 cidadãos que pararam de se agitar nas cadeiras das instalações da Voz do Operário. O presidente da autarquia, António Costa, também permanece imóvel. "Em Lisboa, o túnel é comprido, não sei se consigo ver luz", dirá, minutos depois.


Quarta-feira, noite quase feita. É a quarta reunião descentralizada da Câmara de Lisboa, desta vez dedicada aos munícipes das freguesias históricas do Castelo, Graça, Penha de França, Santa Engrácia, Santiago, Santo Estêvão, São Miguel, São Vicente e Sé. Em cima da mesa, um "absurdo total", um exemplo da "ineficácia e inoperância da câmara". Palavras do vereador. Todos os anos saem dos cofres do município um milhão e 200 mil euros para pagar rendas a cidadãos que foram realojados devido ao estado de degradação dos edifícios em que moravam. Proprietário: a autarquia. Planos e obras de reabilitação: inexistentes. António Costa explica: "A câmara desalojou e lançou empreitadas sem ter projectos. Quando os empreiteiros começaram a trabalhar, viram que os valores acordados era inferiores aos custos efectivos e exerceram o direito de rescisão, obrigando a câmara a pagar dez por cento. Ora, em muitos casos, ela nem sequer teve dinheiro para isso e as dívidas continuam".
O microfone está quase sempre demasiado alto para as três dezenas de cidadãos que intervêm, à vez, ecoando lamentos e apelos, os "prédios entaipados", "inacabados", as "ruínas". "O chão da minha casa-de-banho, que é o tecto da vizinha de baixo, caiu. O da cozinha vai pelo mesmo caminho. Apelei à unidade de projecto e nada." Maria Manuela Fião, inquilina da câmara, exalta-se, sorri ao senhorio, ironiza, pede "luz ao fundo do túnel", aquela que António Costa admitirá que não vê.
Mas os problemas das zonas históricas prendem-se
também com as restrições de estacionamento e tráfego automóveis. "Vir morar para Alfama tornou-se um luxo, mas permanecer é uma tarefa quase impossível", lamenta o cidadão Eduardo Street, gesticulando para o palco ocupado pelo executivo. As questões do estacionamento e do trânsito são, de resto, invocadas por quase todos os intervenientes na reunião descentralizada, que temem ver as freguesias totalmente despovoadas. Às queixas, o vereador Marcos Perestrello responde que a Empresa Municipal de Estacionamento (EMEL) e a Carris estão a reavaliar os serviços prestados e que está a ser equacionada a reposição de parques e de carreiras de autocarros entretanto suprimidas, mas sublinha que o combate ao estacionamento ilegal tem de continuar a ser uma prioridade camarária.
"Quero ficar em Alfama, senhor presidente, e espero morrer em Alfama. Obrigado e bom trabalho", remata Eduardo Street.

Anónimo disse...

Mas porque e' que a CML nao vende estes edificios a privados, que fariam a recuperacao, depois vendendo ou alugando a precos de mercado? O congelamento das rendas e' sem duvida o grande culpado do estado lastimavel de manutencao destes edificios. Eduardo Street ate' pode merecer uma casa da CML com renda baixa, mas quantas pessoas beneficiam de rendas escandalosamente baixas sem que tenham necessidade? E quantas acabam por fazer lucros enormes, alugando quartos a estudantes, etc. ?

Enquanto isso, a classe media que vive na Alta ( e noutros sitios) tem de pagar casas a precos altos, IMT, IMI, uma carga fiscal sobre rendimentos muito elevada, 21% de IVA e ainda tem de pagar educacao e saude privada, por manisfesta insuficiencia da oferta no sector publico.
PD

Anónimo disse...

PRIVATIZACAO!

Anónimo disse...

Infelizmente, caro anonimo, nao acho que vai acontecer. Esta reuniao na Voz do Operario foi apenas um "piscar de olho" ao "povo da esquerda". As opcoes desta CML sao claras: "Recuperacao" da baixa e dos bairros "historicos", em prejuizo da Alta, por exemplo.

Antonio Costa esta' a preparar o PS pos-Socrates. O PS fara' a autocritica das ideias "neo-liberais" de Socrates, e apostara' numa coligacao com os Alegristas, parte ou mesmo a totalidade do BE e mais alguns dissidentes do PCP. Antonio Costa estara' em excelente posicao para unir o PS e liderar esta coligacao. Ate' pode acontecer ja em 2009. So' e' preciso uma oportunidade para dar o "chuto para cima" a Socrates. Por exemplo, Socrates seria um excelente lider de um Alto Comissariado Internacional para as alteracoes climaticas. Seria uma grande oportunidade para Socrates treinar o seu ingles, que bem precisado esta'.

Quanto mais cedo isto acontecer, melhor sera' para a Alta e para Lisboa, e pior para Portugal.
PD

Anónimo disse...

do Publico
Ministério Público investiga atribuição de casas municipais em 2004
08.03.2008

O Ministério Público está a investigar a alegada atribuição ilegal de casas municipais em 2004, quando Helena Lopes da Costa (PSD) detinha o pelouro da Habitação na autarquia lisboeta, noticiou ontem a SIC.
A então vereadora do executivo de Santana Lopes terá atribuído ca-


sas municipais ao seu motorista, ao comandante da Polícia Municipal e outros dirigentes daquela força de segurança, que não cumpriam os re-
quisitos para os fogos lhes serem atri-
buídos, avançou a estação de televisão.
Os funcionários em causa, a quem foram atribuídas casas na urbanização Quinta dos Barros, já possuíam habitação própria na área metropolitana de Lisboa.
Em causa está igualmente a atribuição de um apartamento à ex-directora de Acção Social da autarquia, actual directora da Segurança Social de Lis-
boa e Vale do Tejo, que pagaria uma "renda técnica" de cerca de 400 eu-
ros.
Helena Lopes da Costa afirmou à
SIC que "hoje faria exactamente o mesmo" e teria "movido todos os es-
forços" para que os dirigentes da Po-
lícia Municipal tivessem direito a uma "casa de função".
A situação foi detectada pela sucessora de Helena Lopes da Costa, a
antiga vereadora da Habitação Maria José Nogueira Pinto, e os dirigentes devolveram as chaves dos apartamentos nessa altura. Quanto ao seu motorista, a actual deputada social--democrata defendeu que o funcionário não devia ser prejudicado na
atribuição de casa por ter essa função. Em todos os casos, afirmou des-
conhecer que tivessem já outras ha-
bitações.
Relativamente à antiga directora de Acção Social da câmara, Helena Lopes da Costa justificou a "renda técnica" paga pela dirigente por existirem casos semelhantes com outros dirigentes da autarquia.
A vereadora com o pelouro da Habitação Social na Câmara de Lisboa, Ana Sara Brito (PS), confirmou à Lusa que "houve fogos atribuídos por despacho directo da vereadora Helena Lopes da Costa". Questionada sobre se esse é um procedimento normal, Ana Sara Brito afirmou que "a vereadora o podia fazer e fê-lo".
O pelouro da Habitação Social está a estudar entre dez a 15 fogos atribuídos em circunstâncias que levantam dúvidas quanto ao cumprimento dos critérios de atribuição de habitação camarária. Lusa

Anónimo disse...

Há bairros que definham "há anos"
Câmara de Lisboa pede empréstimo para solucionar "buraco" da reabilitação urbana
09.03.2008 - 11h52 Lusa
A Câmara de Lisboa quer contrair um empréstimo para financiar a recuperação urbana do casco velho da cidade, "um buraco" financeiro e social, com bairros como Alfama e Castelo a definharem há anos sem população nem comércio. O empréstimo, cujo valor não está definido e que a autarquia está a negociar com o Banco Europeu de Investimento, segundo disse à Lusa o vereador do Urbanismo, Manuel Salgado (PS), servirá para dar um novo arranque a obras que estão paradas há anos e permitir realojar as pessoas retiradas de casa, com quem a autarquia gasta 1,2 milhões de euros por ano em rendas.

O presidente da autarquia, António Costa, reconhece que a situação, que em alguns casos se arrasta há quase 20 anos, é "um absurdo", como afirmou esta semana numa reunião de câmara descentralizada do executivo que se centrou nas freguesias em volta da parte mais velha da capital.

"A Câmara lançou empreitadas sem projectos, os empreiteiros viram que as obras eram muito mais caras, rescindiram, a CML tem que pagar 10 por cento da obra [pelas rescisões unilaterais] e não tem sequer dinheiro para isso. É um absurdo, a Câmara paga 1,2 milhões de euros por ano [em rendas], só tem dinheiro para isso", acrescentou o autarca.

O vereador do Urbanismo, Manuel Salgado, não tem dúvidas em afirmar que "este é um dos maiores escândalos da cidade e que "o que se tem feito nos últimos dez anos em reabilitação urbana é um exemplo de ineficácia e inoperância", acrescentando que "os caminhos para sair deste buraco não são fáceis".

Para o executivo, a solução passará por "pedir um empréstimo para a reabilitação urbana que não entra no cálculo dos limites de endividamento" da Câmara, - e é independente do empréstimo de 360 milhões pedido para pagar dívidas e que o Tribunal de Contas chumbou - para "resolver as situações acumuladas".

Maria do Carmo Dias, de 57 anos, saiu da sua casa no bairro do Castelo há nove anos, esperando, na pior das hipóteses, ficar dois anos fora - com renda paga pela autarquia - e então voltar para a sua casa renovada.

Hoje, olha com desânimo para a fachada da casa onde morava, a única coisa que resta do prédio de três andares, demolido por dentro, e continua sem saber por que razão não se fizeram as obras.

"Não fui eu que criei esta situação, da maneira como este país e esta câmara estão, até me sinto mal em receber 600 euros de renda há tantos anos. Com esse dinheiro, já tinham feito as obras na casa", afirmou à Lusa.

Pelo bairro, não faltam histórias de pessoas a quem a reabilitação mudou a vida para pior: Carlos Rodrigues, de 75 anos, passou dez anos fora para voltar para uma casa onde "a sanita foi feita dentro do poliban", numa casa de banho onde só consegue entrar "de lado".

"Isto tem dado conta da vida das pessoas", confirma Maria do Carmo. "Isto era uma família, desmontaram tudo...desertificou-se o bairro, as pessoas vivem desmoralizadas", acrescenta.

A sua mãe, com Alzheimer, já conseguiu voltar para casa, mas as perspectivas não são muito famosas: três inspecções da Lisboagás deram parecer negativo à instalação de gás e no primeiro dia da mudança, caíram bocados da fachada: "isto é coisa que se faça?", questiona.

Para Ana Paula Pousão, o regresso ao bairro do Castelo, de onde saiu há onze anos, está ainda mais longínquo. Quando saiu, levou um subsídio de 600 euros para pagar a renda da habitação - supostamente temporária - onde ficaria.

Com a morte do pai, em 2005, o subsídio foi reduzido para 500 euros. No ano passado, a Câmara mandou-lhe uma factura superior a onze mil euros para pagar (e depois "corrigida" para mais de doze mil euros), alegando que Ana Paula não tinha declarado a morte do pai e tinha recebido subsídio indevidamente, o que esta nega.

"Já provei à câmara que entreguei a certidão de óbito. Entretanto, a senhoria do meu prédio vendeu-o e segundo a câmara, o meu direito de opção caducou", lamenta.

António Costa garantiu-lhe que "o problema ia ser resolvido", mas não há grandes razões para estar tranquila: "fiquei sem casa, não se fizeram as obras, o prédio está em ruínas e ainda fiquei com uma dívida. Não tenho culpa que a Câmara esteja sem dinheiro, agora não o peça é a mim", diz.

Eduardo Street, morador em Alfama, está habituado a ver há anos a desertificação do bairro, de onde saíram muitas pessoas que agora "só pedem para vir morrer à sua casa" e que continuam à espera das obras de reabilitação Pelas ruas de Alfama vêem-se prédios arruinados, entaipados, com andaimes, praticamente porta sim, porta não, ao lado de outros realmente recuperados, pelo menos exteriormente, graças "à iniciativa privada, que é a única coisa que vai resultando".

Muitos senhorios, feitas as obras, esquivam-se aos contratos legais de arrendamento, de que os inquilinos também prescindem, especialmente depois do fim dos apoios ao arrendamento jovem, afirma Eduardo Street.

Resultado: vieram pessoas novas morar para o bairro, mas são principalmente jovens estudantes e imigrantes, que "são bem vindos, mas não vieram para ficar".

O condicionamento de trânsito em Alfama tem também contribuído para a morte lenta do bairro, afirma, uma vez que ao retirar o trânsito ocasional e dificultar o estacionamento, as lojas não têm clientes e fecham, verificando-se dezenas de montras entaipadas por todo o bairro.

"Cada vez há menos serviços, menos lojas, menos farmácias. Vir morar para aqui é um luxo e ficar aqui é uma tarefa quase impossível", declarou.