quinta-feira, 20 de abril de 2006

Um vício para pagar vícios

(Confesso que estive para chamar a este post "Depois disto, venham as putas". Mas sendo este um blog colectivo não quis aborrecer ninguém)

Abriu o casino de Lisboa. Já não me bastava ter apanhado de raspão com a imagem de tudo quanto quer ser colunável, é colunável ou apenas gosta de arquitectura grega, de flute na mão e croquete boçal num ruminar pretensamente elegante, acabo de ter de ouvir o senhor Ho a explicar aos governantes portugueses que o segredo para um superavit governamental está em expandir ab infinito as salas de jogo do país.

Que os chineses gostem de trocar a qualidade de vida ocidental pelo frémito arruinante de ganhar ou perder ao jogo é lá com eles. Que os portugueses se abonequem em surtidas de sábado à noite até ao Estoril para ganhar um Domingo mais amuado pelos euros perdidos nas slots do casino é, também, lá com eles.

Mas que, para pagar megalomanias de campanha eleitoral e pretensos melhoramentos na vida museológica e turística da capital se promova - numa conjuntura em que o sobrendividamento da famílias é um facto estatístico - com primetime e encómios oficiais, uma actividade puramente alienante, sem vantagens para o consumidor que não sejam, para a esmagadora maioria, a ilusória e derrotada esperança de resolver a vida sem ter de trabalhar para isso, é prova cabal do estado de bandalheira de valores a que a classe política e, por reflexo, nós próprios chegámos.

E por isso digo - se, para arranjar dinheiro para pagar aventuras vale tudo, então deixemo-nos de hipocrisias e entremos no jogo a sério. Refaça-se a campanha do trigo dos anos quarenta e dedique-se o Alentejo ao cultivo de papoilas para exportação. Declare-se todo o país como um imenso porto franco e abram-se lupanares para turistas nas zonas nobres das cidades. Concentrem-se as atenções do choque tecnológico na criação de novas armas para vender às guerrilhas de todo o mundo. E façam-se parcerias - pra frente e em força! - com as elites dos países africanos nossos irmãos por forma a bem explorar os recursos tão apetecíveis que eles têm para oferecer. Afinal só irá sem quiser...

(E perguntam-me vocês espantados com tanta verborreia: o que diabo tem isto a ver com o viver na Alta de Lisboa? Bom, se calhar nada, a Alta não é a Expo... Mas não é verdade que a Alta é uma boa ideia a que cada vez - por via da quebra nas vendas - vão faltando mais fundos para acabar as infraestruturas prometidas? Ah sim... e como é que se chama o dono da dona da Alta?...)

11 comentários:

Tiago disse...

Lá estás tu a ser pessimista, Pedro. Não digas mal do país. Não digam mal da classe política. Temos que ser uns para os outros, e tal...




Devem andar a por Valium ou Prozac na água canalizada. Esta é mais uma das coisas que vai passar ao lado dos bandeirinhas.

Há-de haver uma altura em que um grupo de cidadãos decide organizar uma manifestação junto à Assembleia da República por coisas tão ignóbeis como o terem-se baldado depois de assinar o livro de ponto há uma semana atrás. Ou quando decidirem licenciar mais um casino em Lisboa.

Por sermos um país de brandos costumes, ninguém gosta destas coisas, mas há pessoal noutros países que se entretém a atirar tartes de natas a responsáveis por este tipo de atentados lesivos da população. Podem ver dois exemplo aqui, com video e tudo:

http://www.bitstorm.org/gates/

http://www.ifilm.com/ifilmdetail/2667893?htv=12&htv=12


Já sei que alguns vão achar que isto não se faz, que não há necessidade de estas coisas, e tal. Mas pronto, fica a ideia. Se alguém estiver chateado, já sabe, o email está ali no canto superior direito. Podemos conversar.

Tiago disse...

Aqui fica mais uma:

http://www.uhc-collective.org.uk/knowledge/toolbox/attack/subvertising/how_to_pie_guide.htm

Pedro Cruz Gomes disse...

Desculpa Tiago, mas discordo em absoluto com o uso de tartes. Primeiro, porque os doces fazem mal à imagem. Depois, porque é um desperdício usar uma coisa que sabe tão bem numa coisa que já é um desperdício por si mesma.
Sugiro um método mais subtil: uma fralda usada.
Quem se atreveria a dizer - ou fazer - disparates em público depois deste momento embaraçoso?

Rodrigo Bastos disse...

Mas meus caros...isto não é um questão só nossa (país) mas sim global. São "merdolas" (perdoem-me a linguagem mas a palavra têm de ser essa) como estas que me fazem por em causa a inteligência da raça humana. Seremos nós mesmo inteligentes? A sermos, que inteligência é essa? Cá para mim "somos" (em termos gerais é claro ) é muitas vezes uma "cambada" de sado-masos.

E então vejam lá também o exemplo o tabaco... Anda por aí tanta demagogia sobre os maleficios do tabaco e o impacto que este têm nos fumadores passivos e o estado ainda hoje recebe avultosos impostos sobre a venda desta "droga legal"?. E porque é que esses dividentes não são totalmente injectado para programas de apoio aos fumadores com o intuito dos mesmos deixarem de fumar? Balhelhas...

Para quem não sabe...eu sou fumador e concordo com muita das restrições implementadas e a implementar, mas, não posso deixar passar impune esta hipocrisia do nosso estado.

PS: As apostas a 1 centimo têm muito que se lhe diga. E viram no Correio da Manhã onde o Stanley diz que nunca jogou no Casino? Porque será? estará com "medo" de ficar dependente do jogo?

"– Costuma jogar?

– Nunca joguei ou gastei dinheiro em casinos. Tenho muitas outras coisas onde gastar."
fonte: CM - Casino com vício de festa

Quanto às tartes...pessoalmente não concordo com este método ... mas admito que o mpeg que vi teve a sua piada. :))))

Rodrigo Bastos disse...

Caro Nuno.

E as coisas podem ser assim tão taxativas? não vou entrar aqui na discussão por ponto, mas daqui a pouco (já faltou mais) está-se a escrever que "compra armas quem quer "e "disparou quem quis"...Concordando que estamos numa onda de "americanização", parece que os nossos governantes não querem aprender com os erros de outros e isto parece ser uma total atracção para o abismo.

Não estará este modelo a ficar gasto?

Pedro Cruz Gomes disse...

Nuno,
Considerando que a qualidade de vida paga pelas receitas de um casino aumenta na proporção directa das mesmas e que estas só aumentam na proporção directa dos jogadores e das suas apostas...
Ou me escapa algo ou, segundo o teu modelo, só teríamos qualidade de vida no exterior das nossas casas à custa da diminuição da qualidade de vida no interior das mesmas.
Ou estás à espera dos outros, dos "que lá vão" para te pagarem a qualidade de vida do bairro?
Bom, é uma forma de solidariedade...

Ana Louro disse...

Tributação nos dois casinos da região de Lisboa - 50% das receitas anuais. Entre 2001 e 2005 o Estado recebeu 678 milhões de euros.

Em 2005 os casinos portugueses (os 7 em exploração no continente) recuperaram. Empregam 3000 pessoas e dão emprego indirecto a mais 6000 mil. Prevê-se a abertura de mais 3 - Tróia/Setúbal, Vidago e Serra da Estrela. O do Estoril é o maior da Europa (nº de máquinas, clientes e receitas brutas). No casino de Lisboa a Estoril-Sol espera 6000 visitantes/dia.

Não gosto de casinos (e também não gosto da arquitectura do novo como não gosto da maior parte da arquitectura no Parque das Nações). Mas também não gosto de rallys de automóveis, entre outras coisas que por aqui passaram a ser sinónimo de modernidade quando nos outros países passaram à história. E também acho que este é um negócio como outro qualquer e só é cliente quem quer. E como diz um amigo meu "Quem não tem dinheiro não tem vícios". A grande maioria dos frequentadores dos casinos também deixa receitas no sector do turismo (viagens e estadas) e não só. Na Póvoa do Varzim 50% dos clientes são chineses.

O que mais me chocou no meio disto tudo foi a desculpa da construção do casino de Lisboa ser a solução para resolver o financiamento e reabilitação do Parque Mayer como zona de espectáculos (e não a sua reconversão em mais um condomínio de "luxo") e continuar tudo a cair aos pedaços...

E concordo com a frase no Nuno "O que me preocupa é que, o que o estado ganha com isso nunca é reflectido na nossa qualidade de vida."

E há políticos portugueses com quotas no capital de empresas do Sr. Ho...

Rodrigo Bastos disse...

Estamos todos de acordo que o jogo de casino "cria" muitos viciados, certo? Sabemos todos até onde pode chegar esse vicio, certo?...É mais um vício socialmente aceite?. Qual é então o denominador comum no meio nesta coisa dos vicios?. E a hipocrisia do Estado em relação ao tabaco?. A diferença é que o tabaco faz mal à saúde?

Sem querer entrar em polémicas e só para dar mais um termo comparativo, porque não então liberalizar então as drogas leves e as duras e colocar depois um imposto sobre a vendas das mesmas? Não era um "negócio da china" para o estado?. Ajudava assim a melhorar qualidade qualidade de vida dos contribuintes na generalidade?.

Sinceramente deixem-me que vos diga, mas ainda não percebi a frase: "O que me preocupa é que, o que o estado ganha com isso nunca é reflectido na nossa qualidade de vida."

Ana Louro disse...

Então explico pelas minhas palavras. O que me preocupa é o Estado não usar os impostos que recebe, sejam contrapartidas do casino, sejam impostos sobre o tabaco, combustíveis ou outros de forma a melhorar a qualidade de vida de todos dos cidadãos. O mesmo não é dizer que concordo com o casino porque o Estado necessita de arrecadar dinheiro para o equilíbrio das finanças públicas e da economia e para a melhoria da qualidade de vida. Se dependesse de mim a decisão de um casino em Lisboa votaria não (acho que neste aspecto fui clara, mas se for preciso explico porquê, e não é por ter pena dos viciados do jogo - volto a dizer que quem não tem dinheiro não tem vícios, porque não pode tê-los.).

Eu até acho que os impostos sobre certos tipos de produtos/serviços (como o jogo, o tabaco e os combustíveis) deveriam ser ainda maiores. Que tal 90% sobre o jogo em vez dos 50% que referi (em Tróia fala-se apenas de 10 ou 15% de contrapartida para o Estado para "amenizar" a concorrência e a distância ao casino de Lisboa, o que acho ridículo).

E se os chorudos impostos têm chegado aos cofres do Estado então deveríamos ter uma boa qualidade de vida que se traduziria por mais e melhores escolas, hospitais, sistemas de transportes, cultura, ambiente, etc. Mas não temos nada disto. Portanto preocupo-me.

Quanto às drogas por acaso até sou pela liberalização do seu comércio e pela sua tributação. E porque não tornar a prostituição também um sector de negócio legal e tributado? Se existe porque não pagar também impostos como qualquer outro sector. Se eu na minha actividade como consultora tenho que pagar segurança social, IVA, IRS, IRC, pagamentos por conta, etc. e chego a pensar que estou a trabalhar para poder pagar os impostos ao Estado então porque razão os chamados vendedores de vícios não devem ser tributados. Acreditem que as economias paralelas existem e têm ajudado a aguentar o consumo. Mas e por isso devemos manter a sua existência ilegal, fechar os olhos e fingir que não é connosco?. Eu acho que não.

Diminua-se sim a carga fiscal e os impostos sobre o consumo de determinados produtos (alimentação, higiene e até cultura - discos, livros, etc.).

Mas para que a qualidade de vida fosse real à custa do que quer que fosse precisaríamos de bons gestores e eles não estão, infelizmente, no Estado. Resta-nos uma Anarquia?!

Pedro Veiga disse...

Nem mais, Ana!

Rodrigo Bastos disse...

:))) Ana.

Pondo já de lado os fundamentalismos, estamos totalmente de acordo em relação aos gestores públicos pois penso mesmo que é aí que tudo começa..As más técnicas de gestão que são ineterruptamente aplicadas aliadas às "lacunas" ou "insensibilidades" do sistema capitalista, teem "obrigado o estado" a ir buscar receitas extraordinárias e aqui entra direitinho o Casino de Lisboa.

Nem temos melhor qualidade de vida com os dinheiros dos casinos, nem com o dinheiro vindo da CE, nem com o dinheiro dos lucros da grande maior parte das empresas públicas, nem...com nada. Tem é sido feita uma péssima gestão dos dinheiros públicos e essa é que é a verdade que todos sabemos.

Analisemos então esta questão dos casinos com um pouco de mais detalhe....Ainda há umas décadas atrás o casino era personificado pelas casas de jogos clandestinas e aos poucos fruto da sua massificação e da necessidade do estado de receitas extraórdinárias foi sendo considerado socialmente aceite. O facto é que aos poucos e sempre com alguma pouca resistência social efectuada pela nossa "esquerda" -que segundo dizem a balança do social na esquerda pesa sempre mais do que a económica- os casinos vão sempre entrando em Portugal e o argumento é sempre o mesmo.... a avaliação custo beneficio é óptima e é sempre prontamente justificada com o incremento de turismo e\ou com as mais valias económicas (neste caso temos o parque Mayer) sujacentes à sua implementação. As coisas vão entrando...tornando-se normais e nós -povo- "nem aí nem uí" dizemos e aqui estou inteiramente de acordo com o Tiago\Pedro.

Agora pondo o dedo na ferida e não querendo ser populista mas confrontando com a realidade...não esqueçamos que aqueles que aqueles são viciados neste tipo de actividade ficam maioritáriamente na penuria financeira, individados -com os caloteiros que existem mesmo no casino oficial- e com as familias (que nada têm a ver com esse mesmo vicio) destroçadas. Este é um facto indesmentível que deverá ser analisado por nós e vale sempre a pena pensarmos se o nosso estado deverá mesmo patrocionar este tipo de actividades económicas? Se não há dinheiro para o Parque Mayer não há e ponto final parágrafo.

Podem-me dizer...mas eles é que quiserem...e eu respondo mas e então qual o pepel do estado? Tributar o vicío? Vamos assim a todo o vapor para o liberalismo económico? Para a tal americanização da nossa sociedade? Eu pessoalmente não quero, pois olho para os EUA e vejo o "embelezamento do cagalhão" (desculpem-me a expressão).

Quanto à prostituição...acho que não é minimamente comparável com a questão do jogo mas de qualquer forma, faço a exactamente a mesma pergunta que tu fazes pois apesar de ser a "profissão mais antiga do mundo" é infelizmente ainda um assunto incrivelmente tabu em Portugal.

Quanto à droga...sou daqueles que distingue a leve e a dura. Aceito a liberalização da leve como produto regular ou seja anexado a das taxa de IVA existente sem qualquer tributação extraórdinária. Em relação às duras ainda estou a lutar com isso dentro de mim pois a sua liberalização não me parece útil apesar de ver por uma nesga a sua possibilidade pela via médicamente assistida e mais uma vez sem tributação extraórdinária.

E hoje atestar o depósito em Portugal está em média 13€ mais caro do que em Espanha. Isto faz sentido?

O nosso estado é hipócrita...essa ninguém me tira mesmo :)).