quarta-feira, 19 de novembro de 2008

O petróleo, como recurso geológico finito

peak oil curve

Entre muitas adaptações que vamos ter que fazer na nossa vida futura destaca-se a urgente adaptação a um novo “modelo energético”. Quase não restam dúvidas de que a nossa civilização estará prestes a atingir o pico de extracção de petróleo à escala mundial. O ano em que isso acontecerá ninguém ainda sabe ao certo embora os dados mais fidedignos apontem para a próxima década, entre 2010 e 2020.




Este é um tema de difícil abordagem porque logo à partida lida com um recurso fundamental ao desenvolvimento da sociedade moderna. Há na nossa sociedade uma grande relutância em encarar a noção de limite geológico de um recurso tão fundamental como é o caso do petróleo. O “pico do petróleo” ou o “oil peak” é uma teoria alicerçada em modelos matemáticos e estatísticos, desenvolvida na longínqua década de 1950 pelo geofísico King Hubbert.
Existem muitos factores que condicionam o acesso a um recurso natural que é extraído do subsolo, quer seja em terra ou no mar. À cabeça existe logo o grau de conhecimento científico, a tecnologia empregue, as condições naturais da jazida (condições geológicas), a perícia dos operadores humanos no terreno e por aí fora. Depois existem as condições económicas e políticas que condicionam o ritmo do desenvolvimento e exploração de jazidas antigas bem como o ritmo de procura de novas reservas. Ainda há que referir a velocidade de consumo do recurso que está obviamente dependente dos ciclos de crescimento e de recessão das economias. Por cima disto tudo temos ainda a actividade especulativa de muitos grupos económicos influenciando o preço final da matéria-prima extraída.

Muitos analistas económicos suspeitam de que uma nova crise energética não tardará a aparecer – será quase de certeza uma crise muito mais forte do que a do Verão passado, tal como ilustra uma notícia publicada recentemente no jornal Público:

“Consomem-se 85 milhões de barris por dia e em 2030 serão 106 milhões
Mais uma crise de petróleo em perspectiva nos próximos anos
13.11.2008 - 09h12
Por Ana Fernandes
A Agência Internacional de Energia já não tem dúvidas de que os poços petrolíferos em actividade pelo mundo estão a baixar a sua capacidade de produção e, com isso, está aberta a porta a mais uma crise do petróleo.

No seu último relatório, ontem divulgado, o organismo admite que já se regista uma queda de 6,7 por cento na produção, que chegará aos 8,6 por cento em 2030. Com o aumento que se prevê na procura, é urgente que se façam investimentos, ou haverá uma nova crise, eventualmente pior do que a deste Verão, alerta.

A novidade do relatório deste ano é o estudo exaustivo feito pela agência a 800 dos maiores campos petrolíferos do mundo. Para constatar que a taxa de declínio "vai aumentar significativamente no longo prazo." A situação já nem sequer é famosa hoje. Se a procura não se alterar até 2030, será necessário produzir mais 45 milhões de barris por dia para compensar a queda na oferta, diz a AIE.

Só que a previsão é de um aumento da procura. Hoje consomem-se 85 milhões de barris diariamente, mas em 2030 o consumo deverá estar nos 106 milhões de barris. O que coloca um grave problema, já que o petróleo, apesar de tudo, continuará a ser principal fonte energética do planeta.

A solução, defende a agência, é investir. Mas receia que a actual crise económica refreie a aposta no sector, o que conduziria a uma crise energética. Que já não demoraria muito. "É necessário aumentar a capacidade produtiva em 30 milhões de barris por dia até 2015", defende o relatório. Mas "há um risco real que a falta de investimento leve a uma crise na oferta neste lapso de tempo."

E já há sinais disso. Faith Birol, economista da AIE que ontem deu uma conferência de imprensa em Londres, disse que quase todos os dias se sabe de mais um projecto que foi adiado.

A agência considera necessário injectar mais de 800 mil milhões de euros por ano até 2030 para aumentar a oferta. E apostar em novas tecnologias de pesquisa e prospecção.

Há, porém, um grande senão nos tempos que correm. Parte do petróleo que se está a descobrir é muito caro porque, ou está a grandes profundidades, ou é dispendioso extraí-lo, como é o caso das areias betuminosas do Canadá. Com o barril a menos de 60 dólares, alguns destes investimentos podem tornar-se desinteressantes.

Um cenário que alguns dos representantes das principais petrolíferas mundiais, que se reuniram recentemente em Lisboa, afastaram. O seu argumento reside no facto de que a programação dos investimentos das suas empresas não se fazem numa base anual, pelo que as actuais oscilações de preço podem não ser determinantes nas decisões.

Dependência da OPEP

Outro dos dados relevantes do relatório é a geografia do petróleo. A expectativa é que a produção caia mais abruptamente nos países desenvolvidos, com destaque para o mar do Norte e o Alasca. A agência considera que será nos países da OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) que a produção mais crescerá, passando a representar 51 por cento da oferta mundial, contra os 44 por cento actuais.

Muito do investimento que se fará passará, assim, por companhias estatais, que passarão a representar 80 por cento do aumento da produção de petróleo e gás esperado em 2030, avança a agência.

Os cenários avançados são de grande incerteza. A todos os níveis. Da oferta aos preços, o que se tem como certo é a volatilidade. Por estas razões, a que acresce a segurança no abastecimento energético e o combate às alterações climáticas, a agência continua a dar ênfase à aposta em novas fontes.

Os sinais já são positivos. Segundo as previsões apontadas, as renováveis irão ultrapassar o gás, passando a ser a segunda maior fonte de geração de electricidade, já em 2010.

Mas há o outro lado da moeda, sobre o qual é preciso agir. O carvão, dada a sua disponibilidade mais equitativa em termos geográficos, é a fonte de energia cuja procura mais aumenta. Com todas as implicações que isso tem em termos de emissões de gases com efeito de estufa.

Sabendo-se que é na China e na Índia, assim como no Médio Oriente, que se esperam os maiores picos de crescimento da procura, há que encontrar alternativas para fazer face ao aumento das emissões.

Se a tendência actual se mantiver inalterada, os gases libertados pelo sector energético aumentarão 45 por cento entre 2006 e 2030. A agência avança que para se conseguir estabilizar as emissões de forma a que não se ultrapasse um aumento da temperatura global em três graus, tem de se caminhar para um modelo energético de baixo carbono, assente nas fontes alternativas (onde inclui o nuclear) e no sequestro e enterro de carbono.

Isso implicaria um investimento de 3,2 mil milhões de euros, ou seja, 0,2 por cento do Produto Interno Bruto mundial. Para se baixar a fasquia para os dois graus, seriam necessários investimentos na ordem dos 7,3 mil milhões, isto é, 0,6 por cento do PIB global.

Mas só a eficiência energética poderia poupar 5,5 mil milhões em energia. Um dos campos onde se deve agir é nas cidades. É nelas que mais energia se gasta e a tendência é para continuar. Já hoje, dois terços da energia consumida no mundo ocorre nos meios urbanos. Em 2030, esta responsabilidade passará para três quartos.

Mas mesmo no cenário mais restritivo em termos de emissões, o petróleo continua a ter um lugar central. A agência faz questão de sossegar os grandes produtores de petróleo, afirmando que, mesmo que o mundo invista a sério numa economia de baixo carbono, ainda vão ser necessários mais 12 milhões de barris por dia em 2030 a acrescer aos que já hoje se consomem."


As previsões de crescimento têm que ser revistas, os grandes projectos que envolvam uma expansão no consumo de hidrocarbonetos poderão não fazer sentido dentro de uma década.
Há quem não acredite nisto ou que opte, simplesmente, por “colocar a cabeça na areia” e esperar que a tempestade passe. Mas o que aí vem não é uma tempestade, é uma imposição da natureza para mudarmos o nosso estilo de vida porque face a uma escassez de recursos não há malabarismo económico que resista. Acima de tudo é necessário realismo. Realismo para perceber que o declínio da taxa de extracção dos hidrocarbonetos é uma verdade que está a afectar as maiores reservas descobertas há mais de 40 anos – aquelas que têm sustentado mais de 60 % do actual consumo de cerca de 85 milhões de barris por dia; realismo para perceber que a crise que aí vem abre novas perspectivas que podem encaminhar o nosso planeta para um estilo de vida mais amigo do ambiente.
Mas uma coisa é certa: o fim do petróleo barato vai afectar todos os ramos da nossa civilização porque este é um recurso muito versátil e indispensável ao nosso estilo de vida diário. A sociedade humana é que tem que se adaptar à natureza geológica do nosso planeta e não o contrário.

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