terça-feira, 21 de outubro de 2008

A pensar na vida

Comecei a escrever este texto como resposta a um comentário sobre o artigo do Miguel Sousa Tavares. Começou a exceder as dimensões aceitáveis e decidi transformá-lo num post.

Dizia o leitor do Viver na Alta:


"É nestes momentos que me questiono onde andam os demagogos que, em situações idênticas anteriores mas com cores politicas diversas, andavam tão abespinhados a colocar tudo e todos em tribunal!

Será que o poleiro onde estão actualmente ou as casas da Câmara dadas a torto e a direito foram pagamentos suficientes para se calarem e olharem para o lado?

Felizmente vivo fora do país, mas é com tristeza que ouço e vejo todos os dias estas noticias.
Digo que, daqui, os portugueses que optaram por outras realidades e os povos que nos aceitaram, começam a ver o nosso país como a "Republica das Bananas", na qual o compadrio e o favorecimento são as únicas formas de se ver obra feita.

Não que esteja contra a obra feita por privados, aliás, julgo ser essa iniciativa a única que pode trazer alguma actividade e desenvolvimento (pois a do estado é a que vê). Mas ver que esta só consegue algo com favores..."

O problema se calhar está mesmo aí. No capitalismo viciado pelas ligações ao estado. Ou, como se costuma dizer: lucros privados, prejuízos públicos.

Desculpem o tom panfletário e repetitivo mas, o grande problema deste país está na falta de qualidade das elites. E isto já vem de trás.

Os monárquicos do bigodinho retorcido e do fadinho, que empurram para a república a origem de todas as maleitas e tristezas que nos afligem, esquecem que a 4 de Outubro de 1910 o país também estava malzinho muito obrigado, deixado ao abandono por governantes fracos e/ou incompetentes. Os de sangue azul e os outros.

A Primeira República devorou-se a si própria mas, genericamente, foi apenas mais do mesmo.

Depois veio o 28 de Maio e iniciou-se um período que foi sobretudo de isolacionismo. Um finca-pé que nos fez perder todo o século XX. A casinha portuguesa concerteza, o caciquismo, o elogio da ignorância e da subserviência, as colónias. Debaixo da capa inovadora do corporativismo, criou-se um sistema político que não era fascista, nem nacional-socialista, nem nada. Era apenas o que mais se adequava à manutenção do país num casulo. Imutável. Orgulhosamente bimbo.

O 25 de Abril, apesar do revisionismo ridículo de alguns, permitiu a ruptura e trouxe melhorias significativas ao país. E quem vier dizer que não mente ou tem uma falta de memória que aconselha cuidado médico urgente.

A revolução foi positiva mas, como é hábito nas revoluções, não conseguiu mudar tudo. Continua a faltar massa crítica. Capacidade de pensar e agir. De formar alternativas.

Por todo o mundo existem políticos cinzentões, populistas, manipuladores. Faz parte do pacote que vem com a democracia.

Por todo o mundo os gestores estão preocupados sobretudo em obter lucro. Faz parte do pacote que vem com o capitalismo.

Não conheço melhores formas de gerir uma sociedade ou uma economia. As alternativas colocadas em prática falharam de modo dramático nos séculos anteriores.

O pequeno drama nacional é que, por um lado, os políticos são mais incompetentes e centrados nos seus partidos do que é admissível. Por outro, os capitalistas são mais gosmas e menos competentes do que é admissível num mundo em que, como estamos a ver, o capitalista médio já é muito gosma.

O resultado é este:

Falta qualidade na liderança. Qualquer tentativa de mudar de modo profundo e permanente é cortada pelas estruturas partidárias, viveiros de oportunistas e medíocres. Gente chata, com uma verborreia que merece investigação séria de especialistas em linguística e semiótica.

Falta de força na justiça. No modo como são avaliados e punidos os excessos.

Falta de uma opinião pública forte e eficaz. Que obrigue a ter vergonha na cara. Que aponte o dedo às trocas de favores, às casinhas da câmara, aos lugares na administração, aos regressos à política após fracassos provados.

Costumo dizer que não temos de ser perfeitos. Só nos falta um bocadinho mais de eficiência, disciplina e melhor liderança para sermos muito melhores.

14 comentários:

Anónimo disse...

Bravo

Carlos Moura-Carvalho disse...

Concordo.
Parabéns pela lucidez.
O “Mr. Steed” vê, há outros que o fazem também, o diagnóstico está feito.
Falta mudar. Executar. Fazer. Evoluir. Crescer.
Acredito que um dia vai ser diferente. É possível.
Sem segundos interesses, sem calúnias, sem invejas.
Com vontade, com paixão, com competência, com dedicação.
(um comentário lateral: um post como este merecia ser assinado pelo nome verdadeiro do seu autor…)
Abraço

Pedro Cruz Gomes disse...

Pois companheiro mister, eu acho que o problema, mais do que na falta de qualidade das elites, está na falta de qualidade dos cidadãos, o que nos leva a entregar de mão beijada e sem grande exigência, o poder às ditas.

Ao contrário do Camões, entendo que o pior é as fracas gentes tornarem mais fraco ainda um fraco rei.

É a vidinha...

Anónimo disse...

Eu sei que vou ser censurado mas, pelo menos, levanto a questão:
Qual é o objectivo desta "lavagem cerebral?

Mr. Steed disse...

não vai nada ser censurado caro anónimo.

o objectivo desta lavagem cerebral é a tomada de poder pelos Steedianos, uma raça extraterrestre de inteligência superior mas extremamente feia.

:)

Mr. Steed disse...

Carlos, obrigado mas habituei-me a ser o Steed na Internet desde tempos imemoriais. :)

O Pedro também tem razão mas o objectivo de hoje era bater nas elites :)

Luís Lucena disse...

Bravo, Mr. Steed!

Concordo com o Carlos Moura-Carvalho (é mesmo verdade): um rasgo temperamental e racional deste calibre obrigariam o Super-Homem a assumir-se como Carl Kent. Com nome e apelido...

É efectivamente confrangedor que do 1º ao 380º grau, para onde quer que nos viremos, verificar a falta de postura energética, apática, a falta de compromisso (no sentido "empenhamento"), a fragilidade intelectual, a postura acrítica, o laxismo, a permissividade, a falta de seriedade, a falta de decência, de cavalheirismo.

Dos "actores" e, claro, dos "espectadores".

Os que saem desta mediania, apenas lhes restando ter um nível de exigência mais alto, são apelidados de todo o tipo de "classificações". É, infelizmente, mesmo muito mau.

E esta realidade reflecte-se em toda a nossa vida comunitária.

Mas o que é que isto tem a ver com o Alto do Lumiar? ...

Mr. Steed disse...

Nada:

"esta realidade reflecte-se em toda a nossa vida comunitária"

:)

Anónimo disse...

Acho que não se pode pedir muito às elites quando tudo o resto não existe.

As fracas ou fortes elites são resultados da média.

A média em Portugal é francamente baixa, é certo. Como se muda ?
Educa-se, encoraja-se a lutar, mostra-se que...

If you build it they will come.

Anónimo disse...

Sacrifício.

Foi isso que deixou de existir, porque as pessoas deixaram de acreditar que valia a pena.
Não vale a pena lutar se independentemente da luta ou da qualidade dos "concorrentes" a vitória é sabida à partida.

Este exemplo que vos vou dar é fraco e simples, mas é claro do país.
No futebol não existe uma liga verdadeira, existem 3 clubes e "os outros", aqueles que permitem existirem mais jogos e que de vez enquando atrapalham.
Criem expectativas, criem o "talvez se".
Não tenham medo de criar condições justas, porque quando as criamos não sabemos quem vai ganhar, e assim damos o nosso melhor. E se todos dermos o nosso melhor, o resultado será cidadãos melhores, a média sobe e as elites então serão as melhores.

Anónimo disse...

A rotunda foi o melhor exemplo deste estranho efeito de burrice acumulado pelas ultimas décadas.

Se eu não brinco então tu tb não.

OK, q a rotunda era ilegar, so what.
Acham q os seguros vão pagar alguma coisa em caso de acidente num cruzamento daqueles.

Quem é q tem a prioridade ali, num choque, quem é q tem de parar.

Os entendidos q me ajudem, pq para mim ali é a lei do quem chega 1º

Mr. Steed disse...

obrigado pelas vossas reflexões.

o essencial de posts destes não é afirmar a justeza da minha opinião sobre as outras.

o importante é que cada um pense pela sua cabeça.

Henrique Relogio disse...

“Impossible is not a fact, is an opinion,
Impossible is temporary,
Impossible is nothing but potential”

Fica o desafio para que cada um mais do que reflectir contribua e seja uma parte activa para a mudança.

Pedro Veiga disse...

"Só nos falta um bocadinho mais de eficiência, disciplina e melhor liderança para sermos muito melhores."

Isto encaixa que nem uma luva na actuação da SGAL junto dos clientes em relação às anomalias dos andares vendidos recentemente. Ou estarei a ser irónico?

Por mim já estou por tudo quando sei que vizinhos meus moram em andares comparados há 3 anos mas que metem água por todos os lados. Se calhar a culpa é da crise financeira...