sexta-feira, 31 de março de 2006

A morte da cidade - Largo do Rato



Largo do Rato em 1939, antes e depois de uma intervenção de Duarte Pacheco onde, entre outras coisas, foram colocados carris de eléctrico, como se pode ver na segunda fotografia. Anos mais tarde, não me lembro bem quando, mas calculo que tenha sido no início dos anos 80, foi tranformado o Largo do Rato numa enorme auto-estrada.

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Não consigo encontrar referência à obra na net, mas calculo que estejamos em dívida para com o falecido Kruz Abecassis. Corrijam-me se estiver enganado, por favor.




Bem contadinhas, passou a ter-se 11 faixas de rodagem 11 em vez de uma praça, com uns passeios exíguos para os transeuntes. Os eléctricos foram retirados de circulação e mandados para o cemitério, porque a velocidade de arranque dum automóvel não se coaduna com um transporte público tão dolente e poético. Respira-se agora poeira, monóxido de carbono, ensurdece-se com o ruído, perde-se serenidade com tanta agressão.

Fazer uma cidade assim, pensá-la desta forma, não é prestar um bom serviço à população. A obra feita, orgulhosamente exibida como grande (r)evolução na mobilidade da zona, é um engano. Corrige-se um erro, a utilização excessiva do automóvel, com outro erro, o roubo do espaço público para o dar aos automóveis, convidando-os ainda mais a entrar na cidade.

O passo seguinte, na continuidade do raciocínio, é dar ainda mais estrada aos carros. Túneis do Marquês, da Av. João XXI, da Av. da República, alargamento das faixas de rodagem na Av. da Liberdade, na Fontes Pereira de Melo, no Campo Grande. Tudo obras muito úteis à circulação automóvel, com avaliações de grande sucesso inequívocas para os propósitos para que foram construídas, mas no fundo opções cobardes e lesivas da saúde pública e da preservação do espaço urbano. O que devia ter sido feito era investir fortemente na rede de transportes públicos, no equilíbro de distribuição de habitação e emprego e desincentivar o uso do automóvel particular. Um dia, os autarcas responsáveis pelo assassinato de Lisboa ficarão descritos em livros sobre a História da Cidade pelas piores razões. Por enquanto vivem na estúpida ilusão de estarem a fazer uma grande coisa.

13 comentários:

Pedro Veiga disse...

Foi o Sr. Eng. Krus Abecassis o responsável por esta transformação de uma praça em auto-estrada e foi na década de 1980, quando era Presidente da CML. Ainda me recordo de uma intervista num programa da RTP em que ele se orgulhava de ter "ganho espaço" ao ter transformado os taludes com árvores em muros verticais! O jornalísta até lhe perguntou: Não teria sido perferível fazer um túnel? Um túnel? O Sr não sabe a confusão que é o subsolo do largo do rato! - respondeu o Sr. Eng.

Tiago disse...

Obrigado pela confirmação, Pedro. De facto tinha uma vaga ideia cronológica dessa altura e batia com o período do Abecassis. Foi mais ou menos na altura daqueles mamarrachos na rua do Carmo, os que impossibilitaram os bombeiros de ser mais rápidos a acudir ao Chiado.

Mas é desse orgulho bovino que falo. Vejo-os todos a mostrar obra assassina como quem espera aplausos e os assessores lambe-botas a dizer "O sr. doutor está a mudar esta cidade, sr. doutor!". E é verdade. Estão a esfaqueá-la, e a nós.

susana disse...

Não será demais relembrar que o que trouxe de bom o 25 de Abril, também trouxe de mau.

Foi a partir daí que as nossas cidades começaram a ser engolidas pelos mamarrachos construídos em altura, nas zonas anteriormente bem estudadas e desenvolvidas urbanisticamente, tanto nos bairros às Portas de Lisboa, como Pontinha e Benfica, como nas novas cidades de "terrorismo" (vulgo turismo) como Quarteira ou Portimão, numa época em que o dinheiro começou a encher os bolsos de muitos autarcas...

susana disse...

2006 É O ANO NACIONAL DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO

Vamos prestar atenção no que se vai passar.

Sérgio disse...

É caso para perguntar onde é que andavam nessa altura as associações de cidadãos, a sociedade civil, consciente e interventora, garante de um urbanismo responsável.
Quer-me parecer que ou não havia ou havia pouco o que, por muito que nos irrite, significa que a respnsabilidade pelas aberrações é também dos cidadãos e, por maioria de razão, dos nossos pais.
E nós, vamos fazer a diferença?

Rodrigo Bastos disse...

Nem mais Sérgio,

Essa tua pergunta deve ser alvo de reflexão de todos nós aqui na Alta e igualmente das instituições\empresas públicas\privadas responsáveis pelos projecto. Na maioria das vezes ignoram as opiniões dos cidadãos que tentam cumprir o seu papel de cidadania activa pois são olhados como "estorvos" e não como uma mais valia.

Pedro Veiga disse...

É mesmo verdade! Ainda hoje passei por lá e já têm parte das caves betonada. Vai ser bonito morar mesmo em frente ao nó da Ameixoeira. Não há emenda para estes autarcas e planeadores municipais!

Ana Louro disse...

Mas se vão ser demolidos edifícios para a colocação dos pilares dos do viaduto sobre o Lumiar porque razão essa obra não pode ser embargada?

Ana Louro disse...

Precisamos mesmo de um vizinho advogado para nos ajudar nestas coisas. Uma Providência Cautelar não pode parar as obras?

Pedro Cruz Gomes disse...

Mas porque raio é que deveria ser embargada??? Tem concerteza licença de construção emitida depois do projecto aprovado. E, ainda que a última assinatura tenha sido do vereador, a responsabilidade inicial é do técnico camarário que não viu inconveniente na sua construção, não de "autarcas". (Já quanto ao pequeníssimo detalhe do prédio estar a ser implantado em zona "non edificandi" isso é outra história)
E não percebo a vossa indignação: não sendo aquilo destinado a habitação social, alguém obriga alguém a comprar lá um apartamento? Muito mais me choca a construção do estádio de Alvalade (e eu sou sportinguista ferrenho) a meia dúzia de metros de prédios de habitação que têm de levar , semana sim semana não, com o cagarim dos adeptos e da instalação sonora a horas que, na Europa civilizada, já são de descanso (isto para não falar dos concertos rock). Existe legislação sobre o ruído que é tudo menos permissiva. Alguém da CML se preocupou ou preocupa em verificar se é respeitada neste caso?

Ana Louro disse...

Subscrevo o "pequeníssimo detalhe do prédio estar a ser implantado em zona "non edificandi"". Pois é, e aqui temos o aeroporto e quando vim para cá morar também já cá estava (e sabia disso). A questão é que a tal insonorização prometida nos panfletos afinal não é assim tão boa, mas também não é assim tão má (e pode ser melhorada, só é pena é ser à custa de cada um de nós). À noite oiço mais os autocarros da Carris quando vão vazios e a "abrir" para a central da Musgueira do que os aviões que não cumprem os horários a que são obrigados (deve ser das aterragens forçadas).

Pedro Cruz Gomes disse...

Ricardo, estou a falar do novo estádio. O velho tinha uma instalação sonora tão manhosa que nem no interior se ouvia. E estava mais longe dos prédios do que este. E este já foi construído na vigência da regulamentação sobre o ruído. E as coisas evoluem.
Ana: se não estás contente com os níveis de isolamento acústico da tua casa, solicita à CML uma vistoria - é um direito teu (ainda que o tenhas de pagar). O teu prédio foi executado de acordo com um conjunto de projectos, entre os quais se incluía um de verificação acústica. O que a CML terá de fazer é comprovar se o resultado final corresponde ao previsto no dito projecto. Caso isso não aconteça, terás uma óptima ocasião de processares o vendedor do mesmo...
E o prédio está a ser edificado em zona non edificandi? Se estiver, fantástico!!! Vamos pôr a CML em tribunal? Que tal contratarmos o Zé Sá Fernandes?

Lesma Morta disse...

Convido-o a publicar petição sobre a obra que vão construir no Largo do Rato e que tem noticia no meu blog. O endereço da petição é:
http://www.petitiononline.com/lgrato/petition.html