quarta-feira, 15 de fevereiro de 2006

A marcha dos mortos-vivos


(Azinhaga da Cidade, 9h30m da manhã. Ao fundo, o túnel do Eixo Norte-Sul)

Por mais eixos Norte-Sul que fizermos, Av. Santos e Castro, CRIL, CREL, tuneis do Marquês, o problema do trânsito em Lisboa não acaba, apenas será adiado. Haverá sempre um ponto de gargalo em que a quatidade de automóveis que quer entrar será superior à capacidade de absorção da cidade. Aí recomeçam as buzinadelas, as irritações, a poluição atmosférica, sonora e visual.
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Nos debates das autáquicas de 9 de Outubro de 2005, as propostas de medidas dissuasoras da entrada de automóveis na cidade foram timidamente aventadas por medo que fossem impopulares e tivessem consequência eleitorais negativas. Parecem-me, no entanto, tão inevitáveis para Lisboa como inevitável é constatarmos que apesar da crise as pessoas têm mais recursos financeiros agora do que há 20 anos. Mas alguma da qualidade de vida que pensamos ter melhorado é apenas aparente.

Não havendo coragem e competência política para tomar já as decisões necessárias para regular a mobilidade das cidades, só nos resta esperar pelo extertor dos combustíveis fósseis que tornará insutentável para as nossas bolsas a rotina sado-masoquista de mergulhar diariamente nas filas de trânsito.

Então seremos obrigados a acordar deste torpor estupidamente comodista, talvez os transportes públicos passem a ser o meio de deslocação preferencial e se comece finalmente a planear a cidade de forma mais saudável, diminuindo as distâncias entre habitação e emprego.

11 comentários:

Pedro Cruz Gomes disse...

Se o local de habitação fosse próximo do local de trabalho muito deste problema deixaria de existir-

Ana Louro disse...

Exactamente. Eu procurei a Alta para viver porque foi a solução que encontrei para resolver esse problema e neste momento não dependo do automóvel. Não é o melhor que há, mas foi o possível. Acredito que mais pessoas a trabalhar em Lisboa preferissem viver na capital (outras talvez não), mas ter a maioria das pessoas a morar perto do local de trabalho não é compatível com os interesses instalados nos sectores automóvel, dos combustíveis, construção civil e obras públicas, entre outros. O próprio Estado arrecada impostos à custa da massificação do automóvel e não promove uma visão diferente. Só que essa mais valia não é sustentável nem a curto e muito menos a longo prazo. Há 18 anos que ouço falar na necessidade de internalização das externalidades, isto é, dos custos ambientais, sociais e económicos dos impactes provocados pelo sector dos transportes (em especial o individual). Mas como não há responsabilização pelas medidas políticas tomadas pelos governantes quem vier a seguir que resolva, não é? “Está-se” bem.

Pedro Veiga disse...

Este inferno das nossas cidades continuará até que a natureza nos dê ordem para mudar de vida. Desde da década de 1950 que se sabe que os combustíveis fósseis são limitados e que o pico de produção de petróleo está a ser presentemente atingido. Segundo estimativas recentes em 2019 o volume extracção deste hidrocarboneto a nível mundial será inferior em 10% ao que foi extraído em 2005. Ora se continuarmos a funcionar energeticamente desta forma o nosso futuro imediato estará ameaçado por uma grave crise económica de grande amplitude, não prevista pelos nossos economistas.
Um forma de combater este desperdício seria a implementação de uma boa rede de transportes públicos muito menos dependentes dos combustíveis fósseis, mantidos à custa do pagamento de portagens de entrada nas cidades.
Eu não estou muito optimista acerca deste mega problema que vai afectar todo o planeta. De qualquer modo convido todos a visitarem este sítio da internet onde nos podemos apreceber o que o futuro nos reserva em matéria de hidrocarbonetos http://www.odac-info.org/

Boas leituras, apesar de ser em inglês!

Sérgio disse...

Muitas vezes, é a economia que vem ditar a alteração de hábitos. Outras vezes é a política (desde que na versão 'Democracia Musculada'). A longo prazo, a educação tem dado provas de sucesso. No entanto, no curto/médio prazo, a não haver intervenção de nenhum destes factores, não há grandes esperanças.

Postas as coisas muito simplesmente, as pessoas andam de carro porque podem e porque, para a maioria, não há alternativas credíveis.
Eu ando de metro porque estou perto do metro e não considero o carro porque demoro eternidades para chegar ao destino (custo em tempo e gasolina) e porque não tenho onde o estacionar - há, portanto, fortes condicionantes negativas para o uso do carro e alternativas credíveis àquela utilização.
Mas tenho consciência de que gozo de circunstâncias de excepção - se a balança pendesse noutro sentido, muito provavelmente usaria o carro. É a velha dicotomia custo/benefício.

Quanto ao esgotamento das reservas de petróleo, pode ser que aconteça rapidamente e que tenha algum efeito sobre a forma como olhamos a questão. Mas não terá um real impacto, por si só. Estejam certos que outros combustíveis irão surgir (vejam aqui e aqui) o que quer dizer que os carros vão continuar a andar por aí em massa.

Já o planeamento urbanístico tem grandes hipóteses de funcionar. Diversificar parece ser uma boa aposta: seja na criação de diversos polos, em lugar da centralização, seja pela dotação de transportes em malha e não radiais.. aspecto em que uma visão integrada metro/carris é fundamental. Ao contribuirem para fazer do carro uma opção menos interessante, a sua utilização diminui.

Acho que a Alta, ao prever a existência de oferta de habitação e escritórios, poderá dar um contributo neste sentido.

Pedro Veiga disse...

O problema não é o de esgotamento do petróleo. O problema é o nosso apetite por ele ser cada vez maior e de já se ter comsumido metade das reservas! Por outro lado é bom pensar que o uso menos nobre do petróleo é na forma de combustível. Ele é insubstituível na agricultura, na medicina, na química, etc. Ora, se pensarmos bem chegamos à conclusão da urgência em acabar com o desperdício da sua queima.

Sérgio disse...

Pedro,
Desculpe lá mas o problema é precisamente o do esgotamento do petróleo.
E é claro que ele se esgota porque o consumimos em grande quantidade e a um ritmo que não permite a sua reposição natural.

Pedro Veiga disse...

Estou a falar do esgotamento imediato. Pois, se o consumo baixar significativamente para níveis de procura da década de 1960, a sua relativa abundância ainda vai durar por muitas dezenas de anos.
Não podemos falar em reposição natural deste recurso porque ela simplesmente não existe. As condições geológicas de formação de hidrocarbonetos aconteceram em períodos muito específicos e curtos da história geológica do nosso planeta, que actualmente não se verificam. Além disso, a velocidade de desenvolvimento de uma sociedade baseada na exploração rápida e global dos recursos não deixa margem de tempo para a actuação de qualquer processo reposição natural.

Unknown disse...

A ideia da limitação da entrada de automóveis em Lisboa parece-me sem sentido. Pode fazer sentido em Londres ou Paris ou Madrid (enfim, quase todas as grandes cidade europeias) porque têm sistemas de transportes públicos eficazes. Não é o caso de Lisboa. Acharia um insulto inadmissível aos cidadãos da Grande Lisboa se os obrigassem a pagar portagem em Lisboa, depois de décadas de desresponsabilização da parte do poder político em relação ao planeamento urbano e de transportes (as duas coisas são indissociáveis). E eu não sou parte interessada: não tenho carta de condução e desloco-me a pé de casa para o escritório. Se o estado português resolvesse investir a sério nos transportes públicos, daqui a uns 20 anos teríamos uma rede eficiente na AML. Só aí se poderia pôr a hipótese de limitar os carros particulares.

Tiago disse...

Pedro, temos tido uma discussão parecida acerca da dicotomia entre compra de casa e arrendamento de casa. Enquanto este mercado não existir a preços razoáveis, a compra de casa será a opção da maioria das pessoas.

A eficácia dos transportes públicos depende não só do número de veículos disponíveis como da mobilidade que tiverem na cidade. Se a maioria das ruas está atafulhada com o trânsito individual até podíamos ter o triplo da frota de autocarros que a eficácia não seria maior.

Rodrigo Bastos disse...

Pedro: A questão da portagem pode parecer leviana, mas ajudava a solucionar um problema que temos em LX que é o trânsito. A culpa não nos resolve o problema e o que efectivamente precisamos é que de uma vez por toda seja feito um plano competente, coerente e "last but not the least" que seja supra partidário para assim termos a certeza da sua continuidade política. Têm de ser mais uma coisa feita por privados?

A chave está no meu entender na melhoria da qualidade e oferta dos transportes públicos e na mudança de mentalidade dos individuos que utilizam o seu próprio veiculo para se movimentarem de e para a cidade e dentro da própria cidade.

Digo isto com conhecimento de causa, pois como também não conduzo, sou "obrigado" a utilizar o que tenho á disposição em termos de transportes públicos para me deslocar da Alta para o meu emprego que é fora de Lisboa. Note-se que a existência e a distância (pois todos os dias venho e vou a pé) de metro no Lumiar, foi um dos factores que tiveram mais peso na escolha da familia p'la Alta em geral e pelo CT em específico.

Demoro cerca de uma hora em cada trajecto e sou daqueles que perde as tais duas horas por dia em transportes e até concordo com a Joana quando diz que é uma boa oportunidade de pôr a nossa leitura e pensamentos em dia e claro que preferia não o fazer, mas nesta altura do campeonato ter um emprego já não é nada mau ;).

Se em termos de comboios (ao qual também já fui utente) e metro (que deve continuar-se a expandir) estamos relativamente bem servidos (não querendo entrar na problemática dos passes sociais), nos autocarros (não só da Carris) estamos mesmo muito mal servidos pelo menos por duas razões:

1-Os horários raramente são cumpridos - Meto aqui as culpas no trânsito
2-Em muitas zonas, o espaçamento entre as carreiras é enorme (a tocar no irrealista) o que obriga aos utentes um elevado tempo de espera. Isto já para não falar que em determinada hora..."kaput", terminou e a alternativa é só mesmo o dispêndioso taxi (para quem não têm a carta)

Quanto às pessoas...essas são na minha opinião algo comodistas e necessitam mesmo de alguns uns incentivos camarários ;)

Para finalizar, também as empresas estão a sair de Lisboa...

Jibóia Cega disse...

Moro no Parque S.J. Brito e trabalho no Saldanha. Levo o meu carro até ao Metro e nunca demoro mais de 20 minutos desde que fecho a porta de casa até que me sento no escritório...