quinta-feira, 26 de abril de 2007

Badabum!

"A minha ética é a ética da lei", ouvi ontem na Quadratura do Círculo alguém citar Pina Moura. Para além de não ser original, o senhor não é, nem de perto nem de longe, caso único neste país. Da experiência que já levo de contactos profissionais com autarquias, empresas e serviços públicos deste país, esta é - pelo menos oficialmente - a regra a seguir. Acho muito bem.

O que já não acho tão bem é a regra parar por aqui. Seja por formação, seja por deformação, a muitos o estrito cumprimento da lei parece ser suficiente para garantir um sono descansado após um dia pleno de cumprimento do dever. Ora um pouco de sensibilidade e bom-senso para analisar as consequências que poderão advir dessas acções não faria mal-nenhum, servindo antes para diminuir eventuais prejuízos a terceiros e, principalmente, para evitar o alargar do fosso permanente que existe em Portugal entre a coisa pública e os cidadãos.

Porque é que temos sempre de lidar com esta coisa do "eles" e do "nós"?

Vem isto a propósito do mais recente espectáculo montado no Lumiar pelos executantes do último troço do Eixo Norte-Sul, em vias de conclusão (pelas minhas contas, que sou distraído e não sigo todas as declarações do ilustríssimo Presidente da nossa Câmara a inauguração irá ter lugar algures entre os meses de Abril e de Maio... deste ano) - a demolição do prédio contíguo às instalações do Mercado cuja altura colidia com as cotas de trabalho do tabuleiro, a qual começou cerca das 23:30 do passado dia 19. Uma quinta-feira. Sim, onze e meia da noite. De um dia de semana.




Antes que os habituais guardiões da VERDADE-E-DA-DECÊNCIA me venham acusar de não ler o que está escrito na lei e de começar a ofender sem razão, acrescento desde já que não tenho dúvidas de todos os trâmites legais terem sido seguidos. A lei do ruído - elaborada para proteger os cidadãos... de ruídos incómodos nas horas de descanso... - permite que se ocupem as horas de sono de uma população com o ruído proveniente da demolição de um edifício de três andares - desde que em nome do bem público e devidamente autorizado pelos serviços municipais.

Eu também sei que, a ser feito durante o dia, a confusão provocada pelo corte da rua seria enorme. Mas que diabo: não há sábados? Não há domingos? Tinha mesmo de ser durante a noite?


É que o facto de se saber que a lei foi observada não alegra quem tenta adormecer embalado por um ritmado "bum-bum-bum-traaaaaaaaaack!!!" que lhe chega do exterior. E fica-se chateado. Concerteza que se fica chateado.




E já agora: também andei à procura da lei que permite que os empreiteiros mantenham as imediações exteriores do local de uma obra pública imundas por via dos trabalhos realizados, mas essa não a encontrei. Custava muito manter os passeios limpos de terra e da areia usadas para tapar buracos e colmatar tapumes? É que já não bastava a exiguidade do passeio e o risco de se ser atropelado por um autocarro mais apressado a cortar caminho também ter de circular como se num caminho de cabras se tratasse...




Seria possível um bocadinho mais de consideração pelos concidadãos? Seria possível promover uma limpeza periódica? Talvez por alguns dos funcionários que descobrem um tempinho livre a meio da jornada de trabalho vespertina para beber uma mini num dos cafés das redondezas?

Obrigadinho, sim?

8 comentários:

Pedro Veiga disse...

A pressa de acabar uma obra já atrasada é superior à segurança dos cidadãos. O elo fraco acaba sempre por ser esmagado!
A opção do tunel teria sido muito mais ajustada...

Pedro Cruz Gomes disse...

A quantidade de factores que teriam de se ter conjugado para que a passagem em túnel fosse possível!

1. A consciência de que não há limites para o investimento público quando no outro prato da balança está a qualidade de vida dos cidadãos (o projecto é de 89/90);

2.Os protestos e a associação de moradores para lutar pela impantação em túnel como no caso da CRIL;

3. A colaboração com o Metro para que as soluções não colidissem;

4. A visão de uma cidade não seccionada por vias rápidas que não são assim tão importantes para o escoamento do tráfego.

Seria pedir muito.

Pedro Veiga disse...

Mas o automóvel é quem mais ordena nas cidades lusas! Veja-se o exemplo do túnel do marquês. Não se ganhou espaço pedonal à superfície, antes pelo contrário: aumentou o número de faixas para os automóveis e à superfície a área verde e o espaço pedonal nos passeios diminuiu...

Pedro Cruz Gomes disse...

Exactamente. O túnel é apresentado como uma vantagem para os automobilistas: supostamente levam menos tempo a chegar ao centro da cidade. Não vi ainda nenhuma referência às vantagens que trariam à cidade se, pressionados pelo tempo que levam nas filas, optassem por os parquear em paruqes dissuasores situados nas entradas.

Ops... parece que ninguém está também interessado em fazer parques a sério na periferia de Lisboa, não é?

Anónimo disse...

Bem...
Se falassemos num túnel para o ENS, decerto que a coisa estaria pronta lá para o ano 3.000... com um orçamento a decaduplicar, graças às actuações e protestos de grandes cidadãos como os que bem conhecemos em Lisboa!

Ricardo disse...

Infelizmente a opção do túnel foi apenas isso mesmo, uma opção. Se hoje se fala da inclinação do túnel do marquês, imaginem a inclinação entre o Alto da Faia e o Alto do Lumiar.
Quanto á limpeza do Lumiar, haja compreensão. As minis são necessárias porque cantoneiros estão estacionados do outro lado da rua, e não deve ser fácil trabalhar no meio de tanta poeira. ;)

Bom trabalho.

Anónimo disse...

Mudando de assunto, já notaram que o ambiente na zona do lumiar está modificado...para pior!?

Carla Basto

Pedro Cruz Gomes disse...

Ambiente? Qual ambiente - o natural ou o sociológico? E porquê?