sábado, 23 de dezembro de 2006

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Empreendimento Encosta do Mosteiro
EPUL fez negócios com loja da família de administrador
Ana Henriques


"Sentimos que se tratava de um concurso forjado", diz consultor de empresa de decoração preterida

A Empresa Pública de Urbanização de Lisboa (EPUL) fez negócios de perto de 127 mil euros com uma loja de decoração que é propriedade de familiares de um administrador de uma subsidiária sua.

A EPUL - detida a cem por cento pela Câmara de Lisboa - decidiu em 2004 oferecer objectos de decoração e mobiliário a quem lhe comprasse apartamentos na Encosta do Mosteiro, no Restelo. Foi a primeira e única vez que o fez, e resolveu efectuar uma consulta ao mercado para saber qual o fornecedor que lhe oferecia as condições mais vantajosas. A legislação por que se rege a empresa exime-a de lançar concursos públicos para a aquisição de serviços, alegam os seus responsáveis.

Foram consultadas cinco empresas do ramo, quatro das quais de grande dimensão e com créditos firmados em matéria de decoração de interiores: Conceição Vasco Costa, Deca Interiores, Dimensão Móveis e Luísa Bravo. Da quinta empresa, que dá pelo nome de Toque de Classe, nunca ninguém ouviu falar - embora numa fase posterior do processo a EPUL venha a referir-se a ela, num folheto promocional, como uma "conceituada loja de decoração".

Com três empregadas - duas das quais as suas proprietárias - e um capital social de cinco mil euros, o "conceituado" estabelecimento tem a particularidade de pertencer a uma prima da mulher de Adroaldo Azevedo, director de recursos humanos da EPUL e administrador de uma subsidiária sua, e a uma irmã desta. Mais: a própria mulher de Adroaldo Azevedo está muitas vezes ao balcão da pequena loja, a atender a clientela.

Apesar de a proposta da Dimensão sair 6500 euros mais barata à EPUL que a proposta da loja onde trabalha a mulher do director de recursos humanos da empresa municipal, é a esta última que o serviço é adjudicado. A decisão fundamenta-se em três ordens de razões: a Toque de Classe permitiria à EPUL um pagamento mais faseado dos vales de compras a entregar aos compradores; a loja fica defronte do empreendimento em questão; por fim, "o tipo de decoração do Toque de Classe está mais em linha com o espírito da Encosta do Mosteiro", lê-se na proposta de deliberação da adjudicação, numa referência às classes mais altas que a EPUL quer captar para este empreendimento. Só não há qualquer explicação para a contradição entre esta afirmação e o facto de ter sido a própria EPUL a convidar a Dimensão para concorrer ao negócio. Nem a Deca nem a Luísa Bravo apresentaram propostas.

"Somos uma loja pequenina, trabalhamos"
"Sentimos que tínhamos sido usados. Que se tratava de um concurso forjado e que tínhamos sido consultados para fazer número", recorda o consultor de marketing da Dimensão e seu antigo proprietário, Lamartine Ladeiro. "Ficámos extremamente revoltados e enviámos à EPUL uma carta violenta ameaçando queixar-nos às entidades competentes. Se nos tivesse ganho uma Conceição Vasco Costa, entenderíamos, agora uma Toque de Classe...". Lamartine Ladeiro explica que, além de ter apresentado o preço mais baixo, a Dimensão já tinha no currículo uma campanha semelhante.

Os vales de compras na Toque de Classe, cujas dimensões não permitem a variedade de escolha que qualquer uma das outras concorrentes possibilitaria, tinham diferentes valores, consoante o preço das casas. Aos compradores dos apartamentos mais caros, que podiam custar até 612 mil euros, estavam destinados vales de três mil euros, enquanto para os dos fogos mais económicos havia vouchers de 750 euros.

Ao todo são 107 os apartamentos desta terceira fase do empreendimento, cuja construção está a ser finalizada. Acontece que numa primeira fase a EPUL não conseguiu vender mais de 30 fogos, e mesmo agora, mais de três anos depois do início da comercialização, continuam por vender duas dezenas de casas.

A EPUL recusa-se a explicar oficialmente o caso, embora, a nível oficioso, esclareça que nunca pagou a totalidade dos 127 mil euros à loja em questão, uma vez que muitas das casas continuavam sem comprador.

"Somos uma loja pequenina, trabalhamos", diz uma das proprietárias da Toque de Classe, Leonor Saragga, para justificar a escolha da EPUL. A mulher de Adroaldo Azevedo também se mostra parca em explicações, dizendo apenas que se já esteve várias vezes ao balcão da loja não foi por estar ali empregada, mas porque a dona, "que é uma amiga", lho pediu. Recusando-se também a fornecer qualquer esclarecimento, Leonor Saragga observa: "Não percebo a razão deste interesse todo. O nosso trabalho com a EPUL foi perfeito!"



Filho também queria uma casa EPUL Jovem


Tal como já tinham feito filhos de outros administradores do grupo EPUL, também um dos filhos do director de recursos humanos da empresa-mãe, Adroaldo Azevedo - que é simultaneamente administrador de uma subsidiária da empresa municipal - se candidatou recentemente aos apartamentos EPUL Jovem. Embora o regulamento do concurso não o proíba e o sorteio das casas impeça, à partida, qualquer tipo de tratamento de favor, a candidatura de filhos dos principais responsáveis da empresa é controversa. Foi isso que fez desistir a filha do administrador da EPUL António Pontes, em Setembro, de uma casa ganha no sorteio. A sua irmã também se havia candidatado, mas não lhe tinha calhado nenhum apartamento. A.H.

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